Uma das coisas que me surpreendeu da gravidez foi o aumento da flatulência. Durante a minha gravidez eu praticamente me tinha convertido numa botija de gás andante. Eu fazia constantes concertos de trompete, apesar de nem sempre do agrado das pessoas a minha volta.
Esta condição das mulheres gestantes era total novidade para mim e aprendi que é algo completamente normal e tem a ver com as adaptações do nosso corpo para facilitar a gravidez e o parto natural. Quando ficamos grávidas o nosso corpo aumenta a produção da hormona progesterona o que faz com que a nossa digestão fique especialmente mais lenta, aumentando a produção de gases. E, o nosso corpo reage expulsando os gases através de peidos e arrotos. Algumas coisas que podem atenuar esta mudança é vigiar a alimentação e eliminar ou reduzir aqueles alimentos que nos provocam mais gases. Estes variam de pessoa para pessoa, porém alguns alimentos na lista dos principais suspeitos incluem a cebola branca, os feijões, as lentilhas, a couve-flor, os fritos, as bebidas com gás. Fazer exercício com regularidade e beber muita água também podem ajudar a atenuar a produção de gases ao melhorar a digestão.
Por outro lado, na medida que a gravidez vai se desenvolvendo, o aumento da progesterona também tem a função de relaxar os músculos de forma a facilitar o parto, o que limita a nossa capacidade de segurar os gases dentro. E aí é que a história se complica, se o gás estiver pronto para sair, não importa o quanto a gente aperta mas ele vai sair sim, com ou sem estilo.
Em Agosto de 2016 circulou por whatsApp uma cópia de uma denuncia feita por um senhor contra a sua esposa por ela o desrespeitar, entre os motivos deste desrespeito encontrava-se o ‘peidar a minha frente’. E pensei, ‘epa! se peidar em frente do parceiro fosse delito e motivo de separação, eu já estaria separada, denunciada e provavelmente detida!’ Libertar os gases produzidos pelo corpo é algo natural do corpo humano, mas acabou na lista (elaborada por não sabemos quem nem quando) das coisas socialmente inaceitáveis.
Para a maioria das grávidas, por mais que não queiram, lhes dê vergonha ou lhes provoca qualquer outro sentimento desagradável, penso que a gravidez é uma óptima oportunidade para reconciliarem-se com o seu peido. Digo reconciliar-se porque em algum momento das nossas vidas não eram um problema, até era divertido, a minha filha ri-se até cair quando peida conscientemente.
Portanto, penso que quem não se sentia a vontade peidando sobretudo em frente de seus familiares pode aproveitar esta oportunidade para ‘soltar-se’ e desfrutar da experiencia do peido, permitir-se sentir-se aliviada depois do peido sem sentir culpa ou ter que abrir rapidamente a porta ou qualquer outra medida que envia mensagem ao nosso cérebro de termos feito algo errado. De todas formas, é sempre bom conhecer o seu peido, que comidas provocam que cheire mais por exemplo. Nos casos em que tenha comido algo que não só lhe faz dar concertos de trompete, mas que também perfuma a casa com um ‘aroma’ apreciado por poucos, se calhar pode levantar-se e peidar perto de uma janela ou porta aberta. Mas lembre-se que este movimento não é sustentável, porque durante a gravidez a frequência dos peidos vai em aumento.
Algumas de vocês estarão a pensar ‘ya isso é relativamente fácil em casa, mas e com as/os colegas do serviço, quando vou ao banco ou estou em qualquer sítio público?’ E, têm toda razão em se preocuparem porque fomos de muitas maneiras socializadas para agradar outras pessoas. Porém, aqui estamos a falar de uma situação em que biologicamente é difícil controlar os gases, portanto a sociedade é quem deveria sentir-se mal em não nos deixar peidar a vontade e livre de julgamentos quando estamos a contribuir activamente para a ‘reprodução da espécie’.
A minha sugestão é dizer abertamente que está grávida e não consegue controlar os gases e sugerir abrir as janelas se for necessário. Eu usei esta desculpa mesmo nos primeiros meses depois de ter tido a minha pequena. Uma vez acompanhei o meu parceiro a fazer compras e depois de muitas voltas (ele demora muito a decidir o que levar) decidi sentar-me num sofá para descansar e esperar por ele. Depois de uns minutos senti uma imensa vontade de peidar e o fiz com gosto mas logo a seguir uma moça sentou-se ao meu lado. Sorrimos uma para a outra e antes de ela fazer cara de ‘aqui cheira a podre’ eu adiantei-me e disse ‘desculpa pelo cheiro a peido, tive bebé a pouco tempo e esse é um dos assuntos que ainda está fora do meu controle’. E ela logo disse ‘ouvi que as mulheres grávidas peidam muito, é mesmo verdade? Nem me dei conta do cheiro!’ É possível, mas no dia anterior nós tínhamos feito lentilhas, que eu adoro, são nutritivas e normalmente perfumam o meu peido. Então ou ela estava a ser muito solidária comigo ou era anósmica.
Mas bom, tomada a decisão de libertar o nosso peido e a nós mesmas (até porque durante a gravidez não há muitas mais opções), se ainda não o fazemos, é importante aprendermos a desfrutar do acto. O meu parceiro enviou-me um artigo escrito por uma médica alemã sobre a importância de peidar ‘bem’ e gostaria de partilhar 4 dicas que me pareceram úteis:
- Ao peidar é importante ajudar o corpo a libertar todo o gás. Portanto se tiver que tentar apertar algum músculo, que não seja para segurar o peido dentro, mas para ajuda-lo a sair. Isto significa fazer força e empurrar os gases para saírem dos intestinos.
- Adopte algumas posturas que ajudem o gás a sair com mais facilidade: Por exemplo, fique de pé estique ambos braços para frente e dobre ligeiramente os joelhos como se fosse ficar de cócoras. Alternativamente, pode ficar de cócoras enquanto solta o gás.
- Se quiser e poder dar uma força mais ao seu corpo, levante ligeiramente uma das pernas (apoie-a num móvel se for necessário) e separa as nádegas com as mãos enquanto liberta o gás.
- Depois de todo este esforço, respire fundo 2-3 vezes para ajudar o seu corpo a relaxar.
Oxalá a flatulência na gestação nos ajude a libertar-nos de alguns preconceitos.